Uma carta sobre a capa do conto Café & Cigarros.
A ideia do design da capa da minha obra Café & Cigarros foi feita com um cuidado excepcional. Primeiramente, o formato da capa lembra a parte traseira de uma cartela de cigarros, a parte onde há o aviso do Ministério da Saúde sobre os males que essa droga causa. Esse aviso sempre vem com uma imagem que deveria ser chocante, geralmente simbolizando de forma assustadora as consequências do estúpido, irracional e nefasto comportamento de fumar. No entanto, podemos perceber que, ao menos para os fumantes convictos, esse aviso é sem efeito. A cada tragada de seu “picolé de câncer”, a pessoa que fuma pode estar ativamente flertando com a morte, e isso pode ser uma forma de lidar com a frustração de estar vivo. E é no lugar dessa imagem que trazemos uma obra de Picasso, uma obra que estou roubando. Escolhemos colocar um Picasso de natureza morta, uma caveira e uma jarra, contra uma parede, lembrando que a arte também pode ser veneno, que artistas podem ser demiurgos e demônios. Que a arte, tal qual o cigarro, pode nos afastar da frustração de estar vivo mergulhando a pessoa fumante de arte no devaneio da fantasia. E Picasso não é uma escolha aleatória. Tal qual nosso protagonista, Picasso também era um personagem complicado. Se diz que objetificava e violava mulheres, teria sido de difícil trato, mas ainda assim sua obra nos fascina até hoje, mesmo diante da monstruosidade de seu criador. Portanto, o texto se oferece enquanto uma cartela de cigarros, um alívio barato, irracional e prejudicial a saúde. Um flerte com o que há de pior da fantasia para nos fazer esquecer o pior de nossa realidade.
OBS:. Obra agora disponível também em versão física (impressa) na UICLAP.
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